
Um primeiro fato é certo: o luto não é a expressão espontânea de emoções individuais. Se os parentes choram, se lamentam, se mortificam, não é porque se sintam pessoalmente atingidos pela morte de seu próximo.
Certamente pode ocorrer, em casos particulares, que a tristeza expressa seja realmente sentida. Mas, de maneira geral, não há relação alguma entre os sentimentos experimentados e os gestos executados pelos atores do rito.
Se, no momento mesmo em que os que choram parecem arrasados pela dor, lhes dirigem a palavra para conversar sobre algum assunto temporal, acontece com frequência que mudem imediatamente de fisionomia e de tom, e adquiram um ar sorridente, e conversem com a maior naturalidade do mundo.
O luto não é um movimento natural da sensibilidade privada, machucada por uma perda cruel, mas um dever imposto pelo grupo. As pessoas se lamentam, não simplesmente porque estejam tristes, mas porque são obrigadas a se lamentar. É uma atitude ritual que deve-se adotar por respeito ao costume, mas que em larga medida é independente do estado afetivo dos indivíduos.
Quando um indivíduo morre, o grupo familiar ao qual pertence sente-se diminuído e, para reagir contra essa diminuição, se reúne. Uma infelicidade comum tem os mesmos efeitos que a chegada de um acontecimento feliz: aviva os sentimentos coletivos que, por isso, levam os indivíduos a se procurar e a se aproximar.
Não somente os próximos mais diretamente atingidos trazem ao encontro sua dor pessoal, como também a sociedade exerce sobre seus membros uma pressão moral para que harmonizem seus sentimentos com a situação. Permitir que eles permaneçam indiferentes ao golpe que a atinge e a diminui seria proclamar que ela não ocupa nos seus corações o lugar a que tem direito; seria negá-la.
Uma família que tolera que um dos seus possa morrer sem ser pranteado testemunha com isso sua falta de unidade moral e de coesão: ela abdica, renuncia a existir. O indivíduo, por sua vez, quando firmemente ligado à sociedade de que faz parte, sente-se moralmente compelido a participar de suas tristezas e de suas alegrias; desinteressar-se delas seria romper os vínculos que o unem à coletividade, seria renunciar a querê-la e contradizer-se.
Se o cristão, nas festas comemorativas da Páscoa, se o judeu, no aniversário da queda de Jerusalém, jejuam e se mortificam, não é para manifestar uma tristeza espontaneamente sentida. Nessas circunstâncias, o estado interior do crente nada tem a ver com as duras abstinências a que se submete. Se está triste, é sobretudo porque se obriga a ficar triste, e obriga-se a isso para afirmar sua fé.
Vê-se que essa explicação do luto faz abstração completa da noção de alma ou de espírito. As únicas forças realmente em jogo são de natureza inteiramente impessoal: são as emoções despertadas no grupo pela morte de um de seus membros.
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